conto

Respostas

A casa era a mesma. Mas não parecia. A luz que entrava pelas frestas da janela possivelmente era de outro Sol, não podia ser o mesmo. Apenas um porta-retratos era a única coisa que lutava em fazer sentido ali.
Na cozinha, lá estavam. Eles já não se falavam há dias. Sabiam que o motivo tinha sido banal. Mas é como dizem: foi a gota d’água. Aquilo corroía demais o velho coração daquele que era o pai. Mas o filho apenas tinha o orgulho mais forte e por isso fingia bem a indiferença.
Enquanto o pai misturava açúcar no café, o filho levantou sutilmente os olhos censurando o barulho da colherinha que soava como um sino agudo. Para demonstrar que estava atento, em sinal de paz, recolhe a colher antes de se sentir satisfeito. Talvez não estava adoçado suficiente. Teria que ser assim. Tomou num gole só.
Venha cá. – disse com firmeza, porém calmo. Aquilo desconsertou o filho. Não sabia como encaixar sua rebeldia naquele instante. Baixou a guarda e o seguiu.
Saíram sem fechar a porta e continuaram andando. Por fora, notava-se melhor que era uma casa simples, não por falta de recursos, mas porque era suficiente. Os galhos quebrando enquanto caminhavam por uma pequena trilha tomavam conta do silêncio, deixando a situação até confortável.
Ao final do percurso, estava uma pequena canoa na beira do rio. Era um pouco velha, mas carregava, exatamente por isso, sua elegância diante daquele cenário de qualidade singular.
Pensou em dizer mais algumas palavras, mas sentiu que estragaria aquele silêncio. Confiou na intuição do filho que, felizmente, já sabia o que tinha que fazer: desprendeu a canoa e puxou para a água. Em pouco tempo, o Sol entendeu que deveria deixá-los a sós.
Sentados, o pai procurava o olhar fugidio do seu filho. Mas não queria forçar demais. Resolveu baixar o olhar também.
- Sei que não está nada fácil para você.
- O que você sabe de mim? – pensou mas preferiu guardar para si. Optou apenas por virar o rosto para outra direção... escondendo as lágrimas que estavam se represando em seus olhos.
Ficaram calados por bastante tempo. Era preciso esperar um pouco mais.
- Por que estas coisas acontecem? – suas lágrimas já transbordavam quando decidiu murmurar com a voz embargada.
- Nossa sina está exatamente nesta pergunta, filho – vê-lo fragilizado justamente quando precisaria confrontar esta pergunta o fez usar o tom mais paternal possível - Toda pergunta anseia por uma resposta. Mas não há resposta para tudo. O sofrimento fará parte de mim, pois me recuso a aceitar respostas apenas para preencher este vazio que ela deixou.
- Mas não consigo me livrar da pergunta, pai. Por mais que eu tente.
- Jamais conseguiremos.
Pela primeira vez, o filho conseguiu olhar nos olhos do pai e viu toda a dor que carregava sozinho e se sentiu mal por tê-lo culpado pela ausência dela. Como que lendo sua mente, o pai se antecipa e o abraça até perderem a noção do tempo.
Enquanto volta para a nova casa com seu pai, prometeu para si mesmo que manteria sua angustia enquanto viver e assim poder deixar o espaço livre para a resposta que nunca conhecerá, mas que só ela tem o direito de ocupá-lo.
 
Roderictus